Wednesday, October 11, 2006

Regresso

Arvo Part é um dos mais destacados compositores contemporâneos. A sua música é contudo, paradoxalmente conservadora. Radicalmente inspirada na polifonia renascentista.
Como acontece com a maioria dos compositores, e embora se trate de um caso muito particular, também Arvo Part atravessou períodos diversos de criação. Começou por adoptar uma linguagem mais moderna, violenta, apaixonada. Parou. Dedicou-se ao estudo da polifonia francesa e somente depois de um longo período de retiro regressou à composição.
É curioso notar que este regresso ao passado é, afinal, frequente. Mesmo Beethoven, um dos mais arrojados compositores de todos os tempos, um Homem do ideal da Revolução Francesa, já no final da sua vida estuda os modelos de Bach e Haendel para compôr a monumental Missa Solene. Se quiserem pensar ainda um outro exemplo, lembrem-se de Liszt.

Beethoven e Arvo Part partilham assim algumas características interessantes: o estudo das formas mais antigas e a busca da espiritualidade através de textos religiosos após um período de forte criação renovadora.
Julgo que este regresso ao passado, este regresso a Deus, não é inocente e não é explicado pelo cansaço da idade, pelo confronto real com a morte ou o fantasma da sua presença, como é usualmente argumentado.
Passada a juventude, realizada a descoberta dos sentidos, quando tudo apaixona, onde tudo é excitação, chega finalmente o espaço necessário para que a razão possa, em plenitude, emergir do mundo sensível na sua procura pelo imutável, pelo que é eterno, seguro. Eis a razão do regresso ao modelos que nos chegam do passado, que atravessam séculos porque carregam consigo algo consituinte da própria condição de ser pessoa, independente das modas.

Eis o regresso a Deus.

2 Comments:

Anonymous Anonymous said...

Não sei o que comentar, mas achei o texto muito bom.

1:32 PM  
Blogger Renato said...

Obrigado Sara, pelo comentário e pelo post no blog.

3:31 AM  

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