Se tocasse Mozart, tocaria em andamento lento. Muitos pianistas realizam interpretações demasiado rápidas, saltitonas e brincalhonas. Talvez isto seja o resultado da difusão da ideia, errada, de que Mozart é música simples, que as crianças gostam das suas composições e que estas são portanto infantis ou ingénuas. Sentado em frente ao piano, o intérprete que encara a partitura de Mozart talvez imagine a ridícula personagem de Tom Hulce, ou talvez a de uma criança que se recreia com uma bola num qualquer parque verde.
Mas Mozart não é inocência ou alegria patética (gosto muito de ver crianças a brincar, mas essa atitude isolada num adulto torna-se ridícula, covenhamos). No repertório de Mozart encontramos as mais belas melodias da música clássica. Mozart bem tocado pode ser cantado, assobiado, entra no ouvido como uma voz que reconforta, apazigua, não como quem corre ou salta. Uma melodia de Mozart sorri, não dá uma gargalhada. A beleza de Mozart não é a de uma criança que brinca, é a de um velho com o sentido da importância do mundo.