Contam algumas biografias, que no final da estréia da sua oitava sinfonia, Bruckner esperou pelos músicos à saída da sala de concertos na posse de uma caixinha de bolas de berlim. Caixinha essa que ofereceu ao maestro da orquesta. A sua atitude humilde e aspecto “campónio”, contrastante com uma Viena cosmopolita e pretensiosamente moderna, prejudicou muito o reconhecimento da sua música; aliás, ainda hoje o fantasma desta reputação persegue-o, confundindo-se muitas vezes humildade com subserviência.
Compreendo que ouvir Bruckner é complicado, nem que tal se deva à duração de cada sinfonia, de cada andamento. Isso porém não implica monotonia ou desinteresse. É verdade que não existem grandes turbulências emocionais na sua música, pieguice não, certamente. Porém em mais nenhum outro compositor a grandiosidade orquestral revela-se tão clara e poderosa.
Bruckner foi um fervoroso católico, para quem a música desempenhou um papel fundamental na vida religiosa. Quem quiser verdadeiramente apreciar a sua música não poderá negligenciar este facto. Como em conversa referiu um amigo, Bruckner é um homem do Antigo Testamento.
De facto, por vezes sentimo-nos esmagados pela violência da sua música, pela densidade e ambiente que sugere. Porém, se quando já prostrados, encontramos a absolvição no acorde maior final, que encerra mais de uma hora de música, é porque apenas aí, depois de vencida a ilusão, depois de derrotados os pequenos deuses, será possível a entrega convicta da vontade ao Criador, a segura e redentora devoção, o encontro por fim, com a paz.
A paz, ou, se quiserem, a segurança no amor de Deus pelos Homens, mas não a alegria jocosa, porque essa, essa é transitória, é mera ilusão.